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Lenda do Cavalo com Mau-olhado


Um dia, a tia Maria Berta da freguesia de Loivo, acompanhada por três vizinhas, foi aos moinhos, que se situavam lá no regueiro da vila, no meio do monte, para moer uns pobres sacos de milho. Depois de receberem os sacos da farinha, desceram o dito monte em alegre cavaqueira. Maria Berta vinha a contar-lhes o que lhe sucedera na véspera, num passeio a Cortes juntamente com o seu marido. Nesse dia o marido havia estreado um fato muito lindo. Estavam a passar perto da casa de uma mulher que diziam ter fama de feiticeira, quando, olhando para o marido, notou que a camisa estava cheia de piolhos! E eu disse-lhe, contou:

- “Ai! Está quieto António! Como tu tens a tua camisa cheia de piolhos! Ai Jesus, que grandes!”

O marido ripostou-lhe imediatamente: “Olha mulher, eu vou tirar isto tudo e queimar!”

- “Queimas o quê? Não que ela custou muito dinheiro!”

Aquilo tinha sido mesmo coisa da feiticeira. Foi ter com a Pura, uma mulher sabida da aldeia, que resolveu tudo com umas rezas, depois de lhe confirmar que a tal mulher da barraca era mesmo uma feiticeira. — “Ai que puta de feiticeira”, não resistiu a tia Berta no desabafo.

Estavam nestas conversas, quando, mesmo ali à frente das três amigas, apareceu um cabritinho branco aos pinchos! Tia Berta ficou entusiasmada com a aparição, mas as outras duas, ainda a pensar na conversa que tinham escutado, não mostraram tanto entusiasmo.

- Vou apanhar aquele cabritinho! Disse tia Berta.

- Deixa ir o que vai, Maria Berta! Deixa ir o que vai e não tires pelo que está! Respondeu-lhe a mais velha.

- Então ele é tão lindo! Vou apanhá-lo!

- Ó mulher de Deus, faz-nos a vontade!

Tomando consciência das palavras mais sabidas da amiga, logo gritou tia Berta:

- Ai Nossa Senhora do Porto, Cruzes e égua...

Naquele momento desapareceu o cabrito!

Num profundo silêncio acabaram de fazer a descida, e regressou cada uma a sua casa. Mas aqueles dias pareciam ser de má sina para Tia Maria Berta! Mal entrara em casa quando o seu filho, que morava na Mata Velha, lhe entrou de rompante muito atrapalhado:

- Minha mãe, vinde ver o meu cavalo! Não sei o que lhe aconteceu!

- Tem calma filho! Conta-me lá o que se passa!

- O cavalo está caído no chão! Esta manhã levei-o para o campo para comer, quando passado uns tempos, começou por deixar de comer, até que caiu redondo!

- Quem é que estava lá?

- Só estava a vizinha do campo ao lado, aquele que todos dizem ser feiticeira. Ela andava a semear batatas à enxada, mas não tirava os olhos do cavalo.

- Eu não te disse que ela era uma bruxa! A gaja vingou-se no pobre do cavalo! Não te preocupes que eu vou lá desenfeitiçar o cavalo.

Correram os dois para a Mata Velha para cortar o fado. Berta havia escutado de uma amiga de Viana do Castelo, que também vendia sardinhas como ela, e que morava ao pé da Capela das Malheiras, uma reza que resolvia aqueles males. Era aquela a ocasião de pôr à prova as palavras que aprendera e por cobro ao assédio das feiticeiras.

Chegados junto do cavalo, que ainda jazia prostrado, tia Berta colocou-se em posição de respeito e disse:

“Eu te corto a fada

Fada infernal

Corto tudo quanto mau

Todas as dores

Todos os ligamentos saem de ti para fora

Raivas e ódios

Te deixem comer

Te deixem beber

Te deixem fazer tudo quanto é vontade de Deus e S. Cipreste

Tudo quanto eu faço te preste

Em louvor de Deus e da Virgem Maria

Um Pai Nosso e uma Avé Maria

Responderam os dois rezando três vezes o Pai Nosso e a Avé Maria e, no fim, o cavalo pôs-se de pé! A partir daquele dia não mais as feiticeiras importunaram a tia Maria Berta.

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